A Basílica de Nossa Senhora das Dores, em Juazeiro do Norte, nasceu da antiga capela erguida por Padre Cícero Romão Batista. Foi nesse altar sagrado que se elevou a Deus a ação de graças pela conclusão da fase diocesana do processo canônico que pode levar à sua santificação.
Unido a toda a Igreja na véspera de Pentecostes, o bispo de Crato, Dom Magnus Henrique Lopes, presidiu a Santa Missa na noite deste sábado, 7 de junho. Esse momento, profundamente espiritual e histórico, marca a fé viva dessa porção do povo de Deus e da nação romeira.
“Estamos encerrando a nível diocesano e enviando para a Santa Sé todo o processo. Colocamos diante do altar de Deus todos os que trabalharam, rezaram e ajudaram, de uma forma ou de outra, neste grande processo desde o início. Nossa gratidão é colocar a vida destes irmãos e irmãs no altar de Deus”, disse Dom Magnus, ao saudar a assembleia de fiéis.
A Eucaristia foi concelebrada por padres da Comunidade Sacerdotal da Basílica, representantes das diversas paróquias da Diocese, além do inspetor salesiano para o Nordeste, Padre Inácio Vieira, e do provincial dos frades capuchinhos no Ceará e Piauí, Frei Roberildo. Estiveram presentes também Dom Fernando Panico, bispo emérito de Crato e figura fundamental no processo de reconciliação de Padre Cícero com a Igreja, e Dom José Vicente, bispo de Salgueiro (PE) e delegado episcopal para a causa.
Autoridades civis acompanharam a cerimônia e o rito, entre elas o prefeito de Juazeiro do Norte, Glêdson Bezerra; o vice-prefeito Tarso Magno, vereadores e o deputado estadual David Macêdo.
Dia de esperança para o povo nordestino
Na homilia, Dom Magnus ressaltou a grandeza espiritual e pastoral desse acontecimento e relembrou a figura espiritual de Padre Cícero como alguém que escolheu amar e servir, mesmo diante das dores. “Hoje é um dia de imenso júbilo para toda a Igreja, um dia de esperança para o povo nordestino e de consolação para todos os que conservaram uma fé simples e forte, nutrida pelas palavras e pela vida do Padre Cícero [...] Encerramos a fase diocesana de um caminho trilhado há mais de nove décadas. Elevamos ao seio da Mãe Igreja esta espada simbólica – não como arma de guerra, mas como lâmina de fidelidade, cravada no chão fértil do Evangelho”.
Rito solene de encerramento
Após a missa, foi realizado no presbitério da Basílica o rito de encerramento, com a apresentação, o juramento dos membros da comissão e o selamento dos materiais recolhidos ao longo da fase diocesana, distribuídos em seis caixas. Os documentos, que reúnem o inquérito sobre a vida, as virtudes e a fama de santidade de Padre Cícero, serão entregues ao Dicastério para as Causas dos Santos, no Vaticano, pelo postulador Paolo Vilotta — italiano especialista em causas de canonização, incluindo a de Irmã Dulce. O envio será feito com dois exemplares autenticados com o selo diocesano, acompanhados das cartas oficiais do bispo diocesano, do delegado episcopal e do promotor de justiça da causa.
Para entender o processo do Padre Cícero Romão
A Igreja convida todos à santidade, reconhecendo oficialmente alguns fiéis como santos. No Brasil, exemplos incluem Frei Galvão e Irmã Dulce dos Pobres. Antes da canonização, porém, há um rigoroso inquérito para investigar a vida do candidato, verificando sua fama de santidade e possíveis milagres.
A causa de beatificação de Padre Cícero tem raízes longas e marcadas por desafios. Suspenso de ordens em 1894, a reconciliação com a Igreja começou em 2006, por iniciativa de Dom Fernando Panico. Após anos de estudos, o Vaticano concluiu que, em vez de uma reabilitação formal, como inicialmente solicitado, era necessária uma reconciliação entre a Igreja e a sua memória.
Essa reconciliação foi oficializada em 2015, com uma carta do secretário de estado do Vaticano, Cardeal Pietro Parolin, a pedido do Papa Francisco, que destacava no texto os frutos espirituais gerados pela devoção ao Padre Cícero.
Em 20 de agosto de 2022, a Santa Sé autorizou a abertura do processo de beatificação, oficialmente iniciado em nível diocesano em 30 de novembro do mesmo ano. Com essa autorização, ele recebeu o título de "Servo de Deus". Desde então, a fé da nação romeira se fortaleceu ainda mais, sustentada pelo exemplo do sacerdote que ensinou: “Deus nunca deixou trabalho sem recompensa, nem lágrima sem consolação”.
Como chegamos até aqui?
A fase diocesana do processo foi conduzida com confiança, rigor jurídico canônico e acompanhamento técnico do postulador romano Paolo Vilotta. A Comissão Histórica foi responsável por reunir e organizar uma grande quantidade de material, incluindo:
● Mais de 250 páginas de testemunhos;
● 160 páginas de relatório documentado;
● Uma vasta bibliografia sobre a vida e virtudes do Servo de Deus.
● Mais de 60 testemunhas foram ouvidas, além de cartas históricas datadas desde 1934, totalizando dez volumes.
Segundo o vice-postulador, Padre Wesley Barros, essa primeira fase tem por objetivo relatar a vida, as virtudes e a fama de santidade do Padre Cícero, reunindo documentos, textos, imagens e testemunhos.
O que acontece agora?
Com o encerramento da fase diocesana, a documentação será entregue ao Dicastério para a Causa dos Santos, no Vaticano, que abrirá e analisará oficialmente o material. Caso reconheça a validade jurídica do processo e as virtudes heróicas do Padre Cícero, o Papa poderá conceder-lhe o título de Venerável Servo de Deus. Já a segunda fase do processo abordará possíveis milagres atribuídos à intercessão do sacerdote, condição necessária para a beatificação.
“Hoje temos muitos sentimentos no coração, mas, a emoção é um dos principais. Ao mesmo tempo, possuímos a responsabilidade de continuar amando o que o Padre Cícero amou: Deus em primeiro lugar e, depois, praticar o que ele ensinou. Agora o que podemos e precisamos fazer é dobrar os joelhos e esperar, a fim de que, num futuro não muito distante, vejamos o Patriarca de Juazeiro elevado à honra dos altares das igrejas, já que, no altar do nosso coração, ele é o santo do Nordeste”, comentou o Padre Cícero José, reitor da Basílica de Nossa Senhora das Dores e membro da comissão histórica, sobre a vivência de mais um passo do processo de beatificação e a expectativa para as próximas etapas.